Era início de noite de terça-feira, 17 de março, quando o informe publicado pela Sesa (Secretaria Estadual da Saúde) confirmava: Londrina registrava o primeiro caso da Covid-19. A doença, que até então estava distante, acabara de chegar à segunda maior cidade do Paraná, quase três semanas após a primeira positivação no Brasil. A paciente, uma mulher de 52 anos, que havia retornado de viagem à Europa, teve os sintomas iniciais oito dias antes do anúncio.

Imagem ilustrativa da imagem Londrina completa cinco meses de pandemia do coronavírus
| Foto: Sergio Ranalli - Grupo Folha 19-05-2020

Desde então, muito mudou nestes 150 dias oficiais de pandemia, completados nesta segunda-feira (17). Comportamentos, rotinas, tudo se alterou num universo de mais de meio milhão de habitantes. Palavras até estão escondidas no dicionário passaram a ser fundamentais para preservação da vida. Isolamento e distanciamento social. Apenas três dias depois do comunicado, a prefeitura decidiu fechar as atividades econômicas consideradas não essenciais.

Foi quase um mês com tudo praticamente estagnado, entre críticas e elogios. Apesar de custosa, a médica infectologista Claudia Carrilho afirmou que a medida foi fundamental para a preparação do sistema de saúde. “A pandemia em Londrina teve sua curva achatada. O resultado disso foi uma capacidade de atendimento nos serviços de saúde da cidade, sem caos e falta de leitos”, destacou.

Em uma doença que traz consigo algumas expressões de seu comportamento - a partir do que foi visto em outros países -, como curva e platô, a especialista disse que não é possível definir o atual estágio no município. “Estamos em um período de crescimento vegetativo. O índice que mede a velocidade de transmissão oscilou para cima e voltou a cair. Como a curva foi achatada, o pico não deve ser facilmente visualizado nesta situação”, argumentou a professora da UEL (Universidade Estadual de Londrina).

PROTEÇÃO

A máscara acabou se tornando item essencial para prevenção e controle do coronavírus. “O londrinense, em sua grande maioria, adotou a exigência (por decreto municipal) de máscaras nos locais de uso comum da população em geral, reforçando a lavagem frequente das mãos com água e sabão e uso de álcool em gel em suas rotinas diárias”, elencou a enfermeira Flávia Meneguetti Pieri. “Apesar de todos os esforços, as mudanças de comportamento perpassam pela tomada de decisão e de quanto o ser humano está sensibilizado para assimilar este novo comportamento”, lembrou.

MORTES

Já passadas quatro mil positivações da doença, o município tem um índice que chama atenção. Mais de 140 moradores perderam suas vidas para o vírus. A taxa de letalidade está próxima de 3,5%, porém, já chegou a ser a mais alta entre as maiores cidades paranaenses. Parte da queda se deve ao aumento na testagem, que no começo era restrita a quem apresentasse sintomas ou estava internado e, posteriormente, foi ampliada para sinais de síndromes respiratórias.

“Houve aumento importante na testagem e redução nas mortes, provavelmente pelo aprendizado contínuo que foi lidar com uma doença nova. Creio que Londrina vem apresentando uma boa evolução no Estado, embora lenta e cansativa, com ressalvas as mais de 130 vidas perdidas”, frisou Carrilho, que é coordenadora da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Universitário.

INFECTADOS

Mesmo com a expansão dos exames, a cidade pode ter uma quantidade muito maior de infectados em relação aos boletins oficiais. Cerca de 50% das pessoas que tiveram contato são assintomáticas ou oligossintomáticas, indivíduos com poucos sintomas. Consequentemente, não há procura por uma unidade de saúde e não são testadas e incluídas nas estatísticas.

A taxa de ocupação de leitos em Londrina por pacientes com suspeita ou confirmação da Covid-19 nunca alcançou, nos últimos cinco meses, número que beirasse o colapso. Entretanto, a infectologista alertou que este não pode ser único parâmetro para colocar a cidade numa situação “tranquila”. “No HU, os leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) estão constantemente ocupados. Há uma equipe que trabalha diuturnamente e incansavelmente gerenciando os leitos do hospital para que ninguém fique fora da UTI.”

Outros critérios classificados como de extrema importância para tomada de decisões são os recursos humanos, materiais médicos e medicamentos. "Em Londrina, no início, houve risco de falta de EPI (Equipamentos de Proteção Individual), mas isso se normalizou. Sedativos não tivemos problemas graves de faltas. Portanto, não basta o leito, é preciso o leito equipado, profissionais qualificados, EPIs seguros e medicamentos. Há pacientes que chegam a ficar mais de um mês num leito de UTI”, relatou.

LIBERAÇÃO

Aos poucos, entre restrições e afrouxamentos, Londrina foi se adequando ao chamado “novo normal”, mas que de costumeiro nada remete aos dias sem pandemia. Esta sensação de normalidade pode trazer efeitos negativos no combate e prevenção à Covid-19. Com a vacina ainda no campo das especulações quanto à sua aplicação e medicamentos específicos sem eficiência totalmente consensual, o isolamento e o distanciamento ainda são as principais “armas” apontadas pelas profissionais.

“O londrinense precisa considerar que o período médio de incubação da infecção por coronavírus é de 5.2 dias, com intervalo que pode chegar até 12.5 dias, que sua transmissibilidade dos pacientes infectados por SARS-CoV ocorre entre pessoas em média sete dias após o início dos sintomas. Não podemos nos esquecer que a transmissão também ocorre sem o aparecimento de sinais e sintomas. É imprescindível que entendamos a importância das medidas profiláticas instituídas”, ressaltou Flávia Meneguetti Pieri, docente do departamento de Enfermagem da UEL.

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| Foto: Folha Arte

FUTURO

Apesar dos avanços da ciência quanto ao vírus nos últimos meses, pensar no futuro ainda é uma incógnita. “A cidade estará preparada em relação ao número de casos. Os hospitais estão cada vez mais adaptando-se à situação, novas normas de duração de isolamentos estão sendo atualizadas e disponibilizadas, o que facilita o fluxo de leitos nos hospitais. É uma doença muito dinâmica, conceitos mudam com frequência”, evidenciou Claudia Carrilho, doutora em doenças infecciosas e parasitárias.

O universo científico aposta que muitas das normas instituídas não têm prazo para acabar. “É preciso consciência, aceitar que o mundo mudou com esta pandemia. Aceitar que é possível retomar as atividades econômicas com ponderação, rever tudo aquilo que com a pandemia foi possível manter mesmo em isolamento social, e, quem sabe, adotar certas mudanças atualmente encaradas como ‘impostas’ pela sociedade, entretanto, necessárias para nossas vidas futuras”, observou Piere. “Não é hora de baixar a guarda frente às medidas apresentadas no plano de contingência.”

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