Brasília - Investigação da Polícia Federal afirma que a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) monitorou de forma ilegal no governo Jair Bolsonaro (PL) ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), parlamentares e jornalistas.

Segundo a PF, do STF foram alvos da ação clandestina os ministros Alexandre de Moraes, relator de apurações que miram bolsonaristas, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Dias Toffoli. A lista de alvos no Poder Legislativo inclui o atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e seu antecessor, Rodrigo Maia.

Entre jornalistas, Mônica Bergamo, colunista da Folha de S.Paulo, Vera Magalhães, colunista do jornal O Globo, Luiza Alves Bandeira, do DFRLab (Digital Forensic Research Lab), ligado ao Atlantic Council, e Pedro Cesar Batista, ligado ao Comitê Anti-imperialista General Abreu e Lima.

O relatório que fundamentou a fase da operação Última Milha, realizada nesta quinta-feira (11) pela PF, aponta ainda que pelo menos um ex-governador - João Doria (na época do PSDB, hoje sem partido) - e servidores do Ibama e da Receita também foram alvo dos monitoramentos.

A quarta fase da operação sobre a chamada Abin paralela prendeu agentes que trabalhavam diretamente para Alexandre Ramagem, atual deputado federal, pré-candidato do PL à Prefeitura do Rio de Janeiro e ligado ao vereador Carlos Bolsonaro (PL), que também é investigado.

As prisões foram decretadas pelo ministro Alexandre de Moraes, a pedido da Polícia Federal.

A PF investiga se policiais lotados no CIN utilizaram o software de geolocalização FirstMile e se produziram relatórios sobre ministros do STF e políticos adversários do ex-presidente.

O objetivo seria desarticular a Abin paralela, organização criminosa voltada ao monitoramento ilegal de autoridades públicas e à produção de notícias falsas, utilizando-se de sistemas da agência.

Ao determinar as prisões, Moraes afirmou que as investigações "evidenciaram a ocorrência de inúmeras ações clandestinas no período compreendido entre 2019 até 2022 e indicaram que os recursos humanos e técnicos empregados pela estrutura paralela [da Abin] valiam-se de sistemas oficiais e clandestinos para obtenção dos dados necessários para os seus interesses".

Uma das ferramentas utilizadas na ação clandestina é o FirstMile, que obtinha a localização de alvos "com o objetivo de realizar ações de campo ou para tentar vincular opositores a determinadas pessoas, instituições e/ou outras circunstâncias que pudessem contribuir para a construção de notícias fraudulentas".

De acordo com as investigações, há suspeita de que pelo menos dois subordinados de Ramagem, o policial federal Marcelo Araújo Bormevet e o sargendo do Exército Giancarlo Gomes Rodrigues, estavam em "completo desvio da finalidade institucional da Abin".

Ambos estavam cedidos para trabalharem na Abin, que é o órgão responsável por fornecer ao presidente da República e aos ministros informações e análises que subsidiem processos de decisão.

As investigações apontam que os integrantes da Abin paralela tentavam encontrar conexões que ligavam ministros do Supremo a pessoas que eram alvos de outras investigações por irregularidades.

Em um dossiê elaborado pela unidade clandestina, eles tentaram relacionar Moraes a um delegado da Polícia Civil investigado por corrupção, diz a PF.

"A tentativa de associar o excelentíssimo ministro Alexandre de Moraes a determinada pessoa com o fito de difundir desinformação e atingir o Poder Judiciário não foi a única ação clandestina realizada pela estrutura paralela da Abin", diz a PF, acrescentando que outros ministros também foram alvos das ações.

Eles tentaram difundir informações falsas, segundo a PF, sobre parentes e assessores do ministro Luís Roberto Barroso (que é o atual presidente do STF e à época também estava no TSE).

Também tentaram relacionar o ex-diretor-geral da Polícia Federal Paulo Maiurino ao ex-governador do Rio Wilson Witzel porque "o cara é zero currículo e seria indicação do Toffoli".

A Abin paralela também buscou saber se havia relação entre o homem que esfaqueou Bolsonaro em 2018, Adelio Bispo, com rivais do ex-presidente, incluindo Doria, o ex-ministro José Dirceu e o atual senador Sergio Moro. Também foram orientados, de acordo com as investigações, a "caçar podres" dos deputados Arthur Lira e Kim Kataguiri (União Brasil-SP).

Também tentou monitorar se o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia e a ex-deputada Joice Hasselmann tinham relação com um advogado preso sob suspeita de irregularidades na área da saúde do Rio de Janeiro.

TIROS NA CABEÇA DE MORAES

Integrantes da chamada "Abin paralela" na gestão de Jair Bolsonaro (PL) afirmaram em trocas de mensagens que o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes merecia um tiro na cabeça e outras ações violentas, aponta relatório da Polícia Federal sobre o caso.

Nesta quinta-feira (11), a PF deflagrou a quarta fase da operação relacionada ao tema e prendeu agentes que trabalhavam diretamente para Alexandre Ramagem, atual deputado federal, pré-candidato do PL à Prefeitura do Rio de Janeiro e ligado ao vereador Carlos Bolsonaro (PL), que também é investigado.

As prisões foram autorizadas por Moraes. São cumpridos mandados de prisão preventiva e sete mandados de busca e apreensão em Brasília, Curitiba, Juiz de Fora, Salvador e São Paulo.

Em uma conversa em agosto de 2021 sobre investigações sob a responsabilidade de Moraes entre dois presos nesta quinta, Marcelo Araújo Bormevet e Giancarlo Gomes Rodrigues, um deles diz que "esse careca tá merecendo algo a mais".

Outro responde: "Só [fuzil] 7.62". O interlocutor acrescenta: "head shot" [tiro na cabeça].

Em outra conversa sobre a possibilidade de Moraes ser destituído do cargo de ministro, um deles afirma: "Com esse careca filho da puta só tiro mesmo. Impeachment dele não sai".

Segundo a PF, "os investigados Giancarlo e Bormevet, por oportuno, foram intimados para prestarem esclarecimentos sobre os fatos colacionados".

"O primeiro encaminhou atestado de saúde para justificar o não comparecimento, o segundo se reservou ao direito sagrado ao silêncio sob a justificativa de não ter tido acesso às diligências de análise em andamento".

OUTRO LADO

Em seus perfis nas redes sociais, Carlos e Flávio Bolsonaro se manifestaram sobre a operação desta quinta.

“Simplesmente não existia nenhuma relação minha com Abin. Minha defesa atacava questões processuais, portanto, nenhuma utilidade que a Abin pudesse ter”, escreveu Flávio.

“A divulgação desse tipo de documento, às vésperas das eleições, apenas tem o objetivo de prejudicar a candidatura de Delgado Ramagem à prefeitura do Rio de Janeiro”, acrescentou.

“A verborragia do dia da imprensa, o gabinete do ódio do sistema, é tentar dar uma cara à narrativa suja deles, SEM NUNCA SEQUER MOSTRAR NENHUMA PROVA, a não ser o fetiche por minha imagem”, publicou Carlos.

ALVOS DA ABIN PARALELA

PODER JUDICIÁRIO: ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux.

PODER LEGISLATIVO: Arthur Lira (Presidente da Câmara dos Deputados), Rodrigo Maia (ex-residente da Câmara dos Deputados), deputado Kim Kataguiri e ex-deputada Joice Hasselmann, senadores Alessandro Vieira, Omar Aziz, Renan Calheiros e Randolfe Rodrigues.

PODER EXECUTIVO: Ex-governador de São Paulo João Doria, servidores do Ibama Hugo Ferreira Netto Loss e Roberto Cabral Borges, auditores da Receita Christiano José Paes Leme Botelho, Cleber Homen da Silva e José Pereira de Barros Neto.

JORNALISTAS: Monica Bergamo (colunista da Folha), Vera Magalhães (colunista de O Globo), Luiza Alves Bandeira (DRFLab) e Pedro Cesar Batista (Comitê Anti-imperialista General Abreu e Lima).

(Com reportagem de Felipe Pontes/Agência Brasil)