A pandemia da Covid-19 tem mostrado uma característica muita específica no Brasil. Diferentemente de países europeus e asiáticos como a China, de onde o coronavírus se disseminou para mundo, a porcentagem de casos confirmados e óbitos em pessoas jovens é muito maior por aqui em comparação. E no Paraná, a tendência se mantém.

Imagem ilustrativa da imagem Covid-19 não é uma doença apenas de idosos
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Na semana passada, um jovem de 19 anos, morador de Jardim Alegre (Vale do Ivaí), morreu após ser internado em Londrina e se tornou a segunda pessoa mais nova do Estado a vir a óbito em razão da Covid-19. No dia 12 de maio, um menino de cinco anos morreu em Curitiba, também diagnosticado com a doença.

Além das duas vítimas fatais, dados da Sesa (Secretaria de Estado da Saúde) até ontem mostram que 1.102 pessoas até 29 anos foram infectada pela Covid-19. Isso representa 23% do total de casos confirmados, que é de 4.687.

De 0 a nove anos, 126 crianças foram diagnosticadas com o coronavírus no Paraná. A média de idade dos infectados no Estado é de 42 anos, enquanto que a de óbitos é de 67.

INCÓGNITA

"Não é uma doença apenas de idosos ou de quem é diabético ou tem alguma comorbidade. É uma doença que todo mundo pode ter e ainda é uma incógnita porque algumas pessoas desenvolvem a forma grave, outras a leve e outras ainda são assintomáticas", aponta o infectologista pediátrico do Hospital Pequeno Príncipe, de Curitiba, Victor Horácio.

A instituição é referência no atendimento infantil no País e registrou dez casos de coronavírus em crianças. Sete delas evoluíram bem e já receberam alta e três precisaram de atendimento em UTI. Além do óbito do menino, que tinha histórico de problemas neurológicos, uma das crianças já deixou a Unidade Intensiva e a outra segue na UTI, com insuficiência renal.

Victor Horácio revelou que em duas crianças, inclusive na que veio a óbito, foi diagnosticada também a Síndrome Pediátrica Inflamatória Multissistêmica Temporariamente Associada ao SARS-CoV-2 (PIMS-TS). No dia 15 de maio, a OMS (Organização Mundial da Saúde) publicou um alerta a classe médica sobre a nova síndrome inflamatória, que foi diagnosticada em dezenas de crianças e adolescentes no mundo todo e pode estar associada ao novo coronavírus.

"Esta síndrome leva a um processo inflamatório no endotélio vascular (camada de células finas que reveste a superfície dos vasos sanguíneos). Já tivemos registros de óbitos de crianças com este diagnóstico também em São Paulo. Os estudos mostram até agora que se trata de uma consequência do coronavírus", explicou Horácio.

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FATORES

A diretora de Atenção e Vigilância em Saúde da Sesa, Maria Goretti Lopes, reconhece que o número de pessoas jovens infectadas surpreendeu as autoridades e aos cientistas. Ela acredita que vários fatores podem ter ocasionado esta situação singular, como a questão de o Brasil ter uma população bem mais jovem que na Europa, por exemplo, e até mesmo a questão do clima.

"O vírus teve um comportamento diferente aqui. É preciso levar em conta também que esse grupo está mais exposto, já que uma grande parcela são pessoas economicamente ativas. A quarentena conseguiu acima de tudo manter os idosos em casa", frisou.

Apesar de estatisticamente os jovens representarem uma grande parcela dos infectados, a diretora da Sesa lembra que no Paraná mais de 80% dos casos confirmados foram considerados leves e moderados e que na maioria das vezes não houve necessidade de internação.

"Por isso que um dos nossos focos principais é no investimento em equipes multidisciplinares e nas unidades básicas, que é onde esses pacientes serão atendidos inicialmente", afirmou. "E ao mesmo tempo, na outra ponta, garantir que existam leitos suficientes para quem precisar e para os casos mais graves". Do total de casos confirmados no Estado, 322 pacientes ou 7,3 % estão internados, sendo 205 em enfermarias e 117 em UTI.

Cuidados

A pandemia exige cuidados extras dos pais com as crianças. É necessário também bastante diálogo para explicar aos pequenos o que está acontecendo e a importância das medidas de higiene e isolamento social.

A arquiteta Mariana Fernandes, 39, tem duas filhas, de seis e quatro anos, e conta que a família teve que se adaptar para garantir a saúde das crianças. "A nossa principal medida tem sido a de tirar elas de casa o menos possível. No máximo ir na casa dos avós, que também estão isolados. Meu marido quando chega do trabalho faz todo o processo de trocar de roupa, tomar banho para depois ir ficar com as meninas".

A mãe relata que tem conversado bastante com a filhas e orientado sobre as novas regras que precisam ser seguidas. "Temos explicado o que tem acontecido e a importância de fazer a higiene das mãos e também o uso das máscaras. Elas têm entendido bem e por isso acredito que não ficaram com medo de tudo isso", relata. "E nas nossas orações elas pedem para o coronavírus ir embora porque imaginam que só assim vão poder voltar a sair de casa e ver os amigos".

DIAGNÓSTICO PRECOCE

A orientação dos médicos para os pais é que a hora de procurar um pronto atendimento é quando as crianças apresentarem sintomas de pneumonia, como chiado no peito, febre e tosse. "Também no caso das crianças, o diagnóstico precoce faz toda a diferença", ressalta Victor Horácio.

Com a proximidade do inverno, o número de doenças respiratórias aumenta e a vacinação contra a gripe é uma importante aliada. A vacina não previne a Covid-19, mas ajuda a minimizar os sintomas de problemas respiratórios. Crianças de seis meses a menores de seis anos têm direito a dose na rede pública, no entanto, a adesão ainda é pequena.

No Paraná, a cobertura vacinal entre todos os grupos prioritários é de 75%, ainda distante dos 90% preconizados pela OMS e Ministério da Saúde. Em Londrina, da meta de vacinar 36.112 crianças, apenas 10.703 foram imunizadas, o que representa 29%. A campanha de vacinação na cidade começou no dia 23 de março e vai até o dia 17 de junho.