São Paulo - Com o avanço da variante delta do coronavírus no país e provável aumento de novas internações por Covid-19 como já ocorre na Europa e nos Estados Unidos, uma nova preocupação ronda os gestores de hospitais públicos e privados: a dificuldade de reposição de médicos e outros profissionais da saúde.

Médico intensivista diz que hoje  há um respiro nas UTIs do país em relação à Covid, mas que aumentou muito a pressão por outras demandas não Covid, que ficaram represadas durante a pandemia
Médico intensivista diz que hoje há um respiro nas UTIs do país em relação à Covid, mas que aumentou muito a pressão por outras demandas não Covid, que ficaram represadas durante a pandemia | Foto: Gustavo Carneiro

O problema se agravou durante a pandemia, quando uma parte do contingente foi infectada pela Covid-19 e ainda enfrenta sequelas da doença ou pediu afastamento por transtornos mentais, como depressão, ansiedade e síndrome de burnout. Essas baixas se juntaram a outras que já aconteciam rotineiramente.

Uma pesquisa divulgada pelo Sindhosp (sindicato paulista dos hospitais, clínicas e laboratórios privados) do início do mês mostra que o afastamento de funcionários representa hoje o maior entrave ao atendimento do paciente Covid: 46% dos gestores dos hospitais se queixaram disso.

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Segundo Francisco Balestrin, presidente do Sindhosp, os hospitais ainda sofrem os efeitos da pandemia, em que muitos funcionários se afastaram por problemas de saúde ou desistiram do trabalho temendo a infecção.

"Com a queda das internações, isso tem sido acomodado. Mas se a delta provocar mais hospitalizações, vamos voltar a ter os mesmos problemas que tivemos nos picos da pandemia."

Em março, por exemplo, 78% dos gestores relatavam o afastamento de funcionários por questões de saúde como o principal problema enfrentado na assistência de pacientes com Covid.

Para Antonio Brito, diretor executivo da Anahp (associação que reúne os hospitais privados de excelência), há oferta de mão de obra da saúde no mercado, mas o principal desafio tem sido a reposição com funcionários qualificados.

A dificuldade de reposição de quadros é enfrentada também pela rede pública, que viu grande número de servidores se afastar por problemas de saúde durante a pandemia.

Dados da coordenação de gestão de saúde do servidor da prefeitura de São Paulo mostram que desde o início da pandemia até o o último dia 10 foram registrados 11.816 pedidos de afastamento por suspeita de Covid-19. O número representa 9,4% do total de 125.072 servidores ativos.

Somente no mês passado houve 7.296 pedidos de perícia médica por motivo de saúde ou acidente de trabalho. "Não é possível especificar de quantos dias eram essas licenças, se elas foram concedidas e quais foram os motivos exatos, já que dependem de perícia", diz a prefeitura em nota.

O Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (SP) tem hoje 327 servidores da saúde afastados, entre médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem.

"Estamos muito preocupados. Se a delta provocar aumento de internações, não teremos como ampliar mais leitos de UTI Covid [com o atual quadro]", afirma o superintendente do HC-Ribeirão, Benedito Carlos Maciel.

"Os profissionais ficaram muito esgotados, muitos não querem mais dar plantão. Às vezes, a gente contrata a pessoa para dar quatro plantões, ela só dá um e não quer mais. Tem sido um desgaste muito grande manter a equipes", diz.

O médico intensivista Ederlon Rezende, membro do comitê executivo da Amib (Associação de Medicina Intensiva Brasileira), conta que hoje há um respiro nas UTIs do país em relação à Covid, mas que aumentou muito a pressão por outras demandas não Covid, que ficaram represadas durante a pandemia, em especial as cirurgias.

"Muitas cirurgias estão sendo feitas tardiamente, com pacientes mais graves. E os profissionais de saúde ainda enfrentam as consequências da pandemia, uma sobrecarga física e emocional muito pesada. Nunca vi tanto burnout", afirma.

A situação só não está pior porque a vacinação provocou uma redução expressiva dos afastamentos por Covid-19, segundo Nacime Salomão Mansur, superintendente das instituições afiliadas à SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina), responsável pela gestão de 26 hospitais, além de ambulatórios e outras unidades de saúde.