Paraná reconhece importância cultural e histórica do Cavalo Campeiro
Única raça originária do Sul do Brasil conta com apenas 10 criadores no Estado; lei ajudará a viabilizar pesquisas, projetos e campanhas
PUBLICAÇÃO
sexta-feira, 29 de março de 2024
Única raça originária do Sul do Brasil conta com apenas 10 criadores no Estado; lei ajudará a viabilizar pesquisas, projetos e campanhas
Lucas Catanho - Especial para a FOLHA
O governo do Paraná reconheceu o cavalo campeiro como de relevante interesse histórico e cultural para o Estado. O reconhecimento veio a partir da aprovação da Lei 21.856, em dezembro de 2023.
Com a aprovação da lei, o governo poderá promover ações e parcerias com instituições e organismos locais, regionais, nacionais e internacionais, a fim de viabilizar pesquisas, projetos e campanhas relativos ao cavalo campeiro.
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A lei cita ainda a criação de grupos de estudos, de trabalho, projetos de pesquisas científicas e de conservação genética para viabilizar e fomentar medidas que impulsionem a criação, a conservação, o fortalecimento e maior divulgação da raça.
“Essa lei é importantíssima para a preservação da espécie e o resgate histórico da raça. Acredito ser fundamental esse reconhecimento da criação e da conservação da espécie. Não podemos deixar a raça desaparecer, pois existem muito poucos exemplares”, destaca Eduardo Rogerio Cenci, presidente da Abraccc (Associação Brasileira dos Criadores de Cavalo Campeiro).
`UMA SEMENTE DO PARANISMO´
Criador pioneiro no Paraná e vice-presidente da Abraccc, o advogado Elizandro Pellin ressalta que se trata mais do que o simples reconhecimento da importância histórica e cultural de uma raça equina nativa do próprio estado. “Considero uma semente de paranismo, da busca por uma identidade cultural própria do nosso amado Estado do Paraná”, pontua.
Não há informações de outras raças oficialmente originárias do Sul do Brasil que não seja o cavalo campeiro.
ORIGEM
A origem da raça surgiu devido ao extravio de animais por expedições espanholas que partiram do litoral de Santa Catarina até o Paraguai.
Os primeiros registros oficiais de cavalos selvagens nos planaltos de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e também no Sudoeste do Paraná são de 1728. A região era conhecida como Pinheirais do Brasil, por isso o cavalo campeiro também é chamado de "marchador das araucárias".
“Não posso afirmar se tem estados em que o cavalo campeiro ainda não está presente, pois a partir da venda do animal pelos criadores perdemos a rastreabilidade”, destaca o presidente da associação.
200 CRIADORES
De forma não oficial, a entidade contabiliza hoje cerca de 200 criadores da raça no Brasil. A maioria dos criatórios está no Sul do Brasil (50% em SC, 30% no RS e 15% no Paraná) e os outros 5% estão em outros estados.
Segundo a associação, o Paraná conta hoje com 10 criadores do cavalo campeiro. “A raça quase foi extinta e todavia não há uma oferta significativa de bons exemplares, embora o crescimento e a demanda estejam crescendo a olhos vistos”, acrescenta o vice-presidente da Abraccc.
CARACTERÍSTICAS
O cavalo campeiro conta com um andamento marchado, de tríplice apoio, de modo a causar mínimas oscilações verticais e laterais durante a movimentação, trazendo muito conforto ao equitador.
Com crina e cauda abundantes e pelos grossos, as alturas de cernelha variam entre 1,40 m e 1,50 m nas fêmeas e 1,42 m a 1,52 m nos machos, com pelagens variadas.
A espécie tem ainda como características a docilidade, a rusticidade e a versatilidade.
“O campeiro é muito apreciado pela marcha confortável, ideal para cavalgadas em longos percursos, por sua funcionalidade no dia a dia nas lidas do campo e em esportes como os rodeios de laço. Sua rusticidade contribui ao homem do campo pela pouca manutenção. A raça adaptou-se bem aos grandes frios do sul do Brasil, bem como nas áreas pedregosas, onde seus cascos sofrem pouco desgaste”, detalha Eduardo Cenci.
A ASSOCIAÇÃO
A raça começou com 19 criadores, mas atualmente a Abraccc conta com 123 sócios registrados.
A associação tem como objetivo fomentar a raça e prestar serviços de registro de animais. Além disso, executa e acompanha a formação de técnicos, auxiliando os criadores na participação em exposições.
“A burocracia e exigências solicitadas pelo Estado dificultam a criação. Vejo que as vacinas de combate ao mormo e influenza poderiam ser disponibilizadas pelo Estado, ou subsidiadas. Assim continuaríamos com plantéis saudáveis, com custo menor ao criador, que poderia aumentar e vender com mais facilidade seus animais.”
PIONEIRISMO
O advogado Elizandro Pellin cria hoje cerca de 30 exemplares de cavalo campeiro em sua propriedade, a Passo da São José, localizada na barranca do Rio Santo Antônio, em Pranchita (PR), divisa com a Argentina.
“Essa raça se formou nas regiões das araucárias da região sul, notadamente sudoeste do Paraná, planalto catarinense e serra gaúcha. É, portanto, a única raça equina que se moldou também no Estado do Paraná.”
Embora o reconhecimento da raça junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento tenha ocorrido em 1985, graças ao trabalho de abnegados da cidade de Curitibanos (SC), esses animais de andamento marchado e com características do cavalo ibérico sempre estiverem presente na vida dos desbravadores do sudoeste paranaense.
O advogado ressalta que o seu nascimento tem ligação com o cavalo campeiro. “Na década de 1960, meu avô paterno criou um potro marchador de pelagem zaina e o entregou para ser domado ao meu futuro pai, que na ocasião conheceu minha mãe. Então creio não ser exagero atribuir ao `marchador das araucárias´ e elo que uniu meus pais e me gerou.”
CAMINHADAS LONGAS
Pellin relembra que, antes de saber da existência da associação de criadores e mesmo da denominação cavalo campeiro, começou a selecionar, em 2003, os exemplares remanescentes das barrancas do Rio Santo Antônio, que divide Brasil e Argentina. Hoje ele segue mantendo em sua criação a linhagem de sangue exclusiva daquela região.
“O campeiro, como a própria denominação esclarece, é para as lidas de campo. Entretanto, considerando seu andar marchado de extrema comodidade, aliado à mecanização das atividades rurais, acredito que sua maior aptidão atual seja para atividades de lazer, cavalgadas longas e confortáveis, promovendo o fortalecimento de laços familiares e amizades”, conclui.