Imagem ilustrativa da imagem DEDO DE PROSA| A geada da minha infância

Contava eu dez anos de idade quando a “geada negra” se abateu sobre o nosso querido norte pioneiro – a terra dos “pés vermelhos”. Naquela manhã gélida pudemos notar os trágicos efeitos deste fenômeno climático que assolou a economia e o modo de vida de milhares de pessoas que dependiam do agronegócio.

A temperatura despencou bruscamente para 9 graus negativos naquela madrugada de 18 de julho de 1975. No dia anterior a capital do Paraná registrou neve para delírio dos curitibanos. Famílias saiam às ruas para comemorar construindo os tradicionais bonecos de neve e se divertir com a passagem deste fenômeno.

Mas quando os primeiros raios de sol começaram a sair o que se viu foi assustador e desolador: 850 milhões de pés de café foram atingidos; 300 mil agricultores foram afetados em suas lavouras; 80 mil pequenas propriedades deixaram de existir...provocando um êxodo rural de proporções gigantescas e sem precedentes em nossa história, calculado em aproximadamente 2 milhões de pessoas!

Este tipo de geada é chamada de “negra” porque os ventos frios e fortes queimam a vegetação por dentro, impedindo a rebrota após a intempérie obrigando os agricultores a erradicar por completo as plantas atingidas. A vegetação e os cafezais ficaram como que chamuscados após sua passagem.

Naquela manhã fatídica acordamos com uma sensação de que não era normal tanto frio, mas nem podíamos imaginar ou calcular os efeitos danosos da onda de frio intenso e desconfortante que tomava conta de nós. Recordo-me ver papai regando o pé de limão taiti que havia plantado meses antes perto varanda da edícula onde morávamos. Com a água tentava em aliviar o gelo que se acumulava sobre suas folhas. Tarde demais!

Aos subirmos ruas acimas do bairro onde morávamos, bairro este que recebe o nome em homenagem à riqueza produzida pelo café (Ouro Verde) nos deparamos com cenas que ainda estão na memória: pessoas envoltas em várias camadas de roupas e soltando uma “fumacinha” quando pronunciavam palavras ou simplesmente respiravam. Murmuravam e reclamavam o tempo todo da quantidade de frio que sentiam. O campo de futebol, ainda de terra batida enfrente à igreja, guardava uma fina camada de gelo que se quebrava quando passávamos. Era uma festa só!

A velha barraquinha do “Seo Joaquim” servia café quentinho para “espantar o frio” e o Bar do Ponto do “ Zé do Bar ” a boa e velha cachaça pra “esquentar o peito”. A geada logo ganhou os noticiários e as rádios AM locais transmitiam os efeitos da intempérie.

Nossa região colhia safras que correspondiam a 50% da produção nacional. A “sorte” é que boa parte do café já havia sido colhido e estocado antes da madrugada histórica de julho de 1975. Novos rumos tomaram a agricultura e o agronegócio norte paranaense após geada negra. Agricultores tiveram que se reinventar frente à crise, porque eles nunca desistem! É uma questão de vocação, sacerdócio... Um aplauso de e um “viva” a estes bravos heróis dos campo que colocam em nossas mesas os víveres de cada dia que necessitamos para nossa sobrevivência!!!

Valdinei Franco é leitor da FOLHA

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