Quem é a pessoa que não deixa o 'Big Ben' de Londrina parar?

Há 54 anos, José Gonçalves cuida do primeiro arranha-céu de Londrina e do Relojão no seu topo

Publicado quinta-feira, 29 de agosto de 2024 | Autor: Maria Tereza Nascimento às 19:54 h

Anos 70, um jovem de 22 anos entra no primeiro arranha céu de Londrina, no centro de Londrina. O Edifício América tem exuberantes 17 andares projetados para concentrar a comercialização do café do auge do Ouro Verde na região e ascensorista foi a primeira função do jovem.

Foto dos Arquivos da Folha de Londrina mostra o relógio em detalhe
Foto dos Arquivos da Folha de Londrina mostra o relógio em detalhe | Foto: Arquivo Folha

Hoje, José Gonçalves tem 78 anos de idade e completa 54 anos de trabalho no Edifício América, apontado hoje em dia como o prédio do ‘Relojão’ de Londrina e conhecido ao longo da história como o prédio da papelaria Central ou edifício do Café e recentemente de 'Big Ben' de Londrina, pelo influencer digital e youtuber londrinense Felca, no vídeocast Inteligência Ltda no Youtube. Gonçalves é responsável pelo cuidado com a estrutura do Edifício e do 'Relojão' de Londrina, cuja manutenção técnica é feita pela família de relojoeiros Ueda desde sua construção.

Rotina que marca, dia após dia, o ritmo de crescimento da cidade há muitos anos.

José Gonçalves, mais de meio século, cuida de um dos simbolos da história de Londrina
José Gonçalves, mais de meio século, cuida de um dos simbolos da história de Londrina | Foto: Maria Tereza Nascimento

Antes, Gonçalves já havia trabalhado numa gráfica no centro, também, como técnico de manutenção no aeroporto e até de porteiro em um prédio que ele ajudou a construir, como servente de pedreiro, na Avenida Paraná nos anos 60. Mas, foi no edifício do Café que ele encontrou mais que um emprego; encontrou o amor, casou-se e formou uma família no apartamento que ele mesmo reformou. O tempo, como o relógio do qual cuida, trouxe alegrias e também provações. “Aqui me casei, criei meus dois filhos e cuidei seis anos da minha segunda esposa quando ela teve Alzheimer”, compartilha.

Avenida Paraná, centro de Londrina
Avenida Paraná, centro de Londrina | Foto: iStock

O tempo mudou o edifício, e com ele, o papel de José. O zelador, que relutou em assumir essa responsabilidade, agora a exerce com orgulho. “Aqui eu faço de tudo. Não sou só zelador. Eu mexo com a parte elétrica e encanamento. Eu tomo conta do prédio e do relógio. Todo problema que dá, eu tenho que resolver ou encontrar alguém que resolva.”

Vista aérea de Londrina
Vista aérea de Londrina | Foto: Anderson Coelho/iStock

Nos anos áureos do café, o prédio fervilhava de vida. De acordo com José, dos anos 80 a 90 a portaria “fervia de gente, mas agora está calma”. No entanto, a importância do relógio não diminuiu. O zelador conta que, uma vez, moradores do cinco conjuntos, zona norte de Londrina, estavam ligando para saber porque o relógio não estava funcionando. “Se esse relógio parar, todo mundo reclama. Ele serve como serviço para a cidade”.

Vista aérea de Londrina
Vista aérea de Londrina | Foto: Anderson Coelho/iStock

Atualmente, o relojão não pode mais receber visitas por ordenação do Corpo de Bombeiros. As únicas pessoas que sobem até lá são José e o relojoeiro. “Hoje que está ventando, o ponteiro do relógio enrosca, aí amanhã o técnico vem para desenroscar”, explica.

Enquanto o zelador sobe até o topo do edifício para verificar as caixas d'água ou trocar as lâmpadas que iluminam o relógio à noite, ele mantém vivo o símbolo que continua a marcar o compasso da vida em Londrina e promete que enquanto estiver aqui, o relógio continuará a funcionar, assegurando que o tempo não pare de fluir.

Relojão de Londrina "Big Ben" foi apresentado em videocast nacional  como símbolo histórico da cidade
Relojão de Londrina "Big Ben" foi apresentado em videocast nacional como símbolo histórico da cidade | Foto: Isaac Fontana/ Arquivo Folha

História do relojão

O relojão do Edifício América, em Londrina, foi contruído em 1958 pela Fábrica de Relógios Dimep. E inaugurado junto com o edifício do café. A construção representa um dos maiores relógios do Brasil, com 6,50 metros de comprimento e 6,50 metros de largura. Já a estrutura de suporte mede 3,50 metros e os ponteiros, feitos de lata e ferro, têm 3 metros e 2,80 metros. Na época, o relojão tinha o patrocínio da Papelaria Central e teve muitos patrocinadores ao longo dos anos, por ser mantido por iniciativa privada.

Tetsuo Ueda, relojoeiro que começou a cuidar do relojão em 1972, desempenhou um papel crucial na sua manutenção. Desde então, a responsabilidade passou para seu filho, Carlos Ueda, que herdou o compromisso com o relógio.

Visível de vários pontos da cidade, o relojão é mantido em funcionamento por duas baterias que emitem um sistema de impulsos elétricos para movimentar os ponteiros a cada 60 segundos. Depois de tantos anos, ele continua a ser um marco histórico e cultural para Londrina, refletindo o progresso e o orgulho da cidade ao longo das décadas.

Vista aérea de Londrina, relógio pode ser visto próximo na linha da Catedral Metropolitana de Londrina
Vista aérea de Londrina, relógio pode ser visto próximo na linha da Catedral Metropolitana de Londrina | Foto: iStock
(detalhe)
(detalhe) | Foto: iStock

Em sua coluna social de 2019, o jornalista Oswaldo Militão citou que o relógio “sempre significou o estímulo ao progresso da cidade: a hora certa para os grandes negócios da cafeicultura, dos tempos áureos do "ouro verde" [...] Ele, achamos nós, ainda é o símbolo maior para entusiasmar o progresso da cidade: marca o tempo, sugere que tempo é progresso da cidade, pois tempo é dinheiro, é desenvolvimento, não tem volta, e é dele que a cidade precisa, para gerar empregos e melhor a vida de todos”.

Maria Tereza Nascimento estagiária com supervisão de Patrícia Maria Alves (editora)


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Felca apresenta 'Big Ben' de Londrina para Rogério Vilela do Inteligência LTDA.