O fatalismo é uma postura psíquica onde o indivíduo, aprisionado em uma visão apocalíptica, enxerga o mundo através de suas fantasias que distorcem a realidade para o pior cenário possível. Este fenômeno, intrincado e complexo, tem raízes profundas na estrutura do psiquismo, na dinâmica das angústias e na constituição de como cada um funciona.

Essa reação fatalista sobre os acontecimentos da vida pode ser compreendido como uma defesa psíquica contra a angústia da incerteza e do desconhecido. Freud, em sua teoria dos mecanismos de defesa, nos ensina que a mente busca incessantemente modos de proteger-se contra o desprazer. Quando a realidade se apresenta com sua imprevisibilidade, alguns indivíduos são tomados por uma ansiedade assustadora, e, como resposta, projetam um futuro catastrófico que, paradoxalmente, lhes oferece uma espécie de controle. É como se, ao prever o pior, o sujeito pudesse de alguma forma se preparar e, assim, encontrar uma sensação ilusória de segurança.

É importante dizer que o fatalismo não é apenas uma visão pessimista do futuro, mas uma reencenação, na mente de quem o sente, das angústias primordiais que nunca foram devidamente elaboradas ao longo da vida dessa pessoa. É como se ela ficasse presa em experiências que houveram e foram sentidas como muito dolorosas e assustadoras, sem chance de serem transformadas em algo mais tolerável. Quando isso ocorre essas pessoas sentem-se sem esperanças e acreditam mesmo no sentimento aterrorizante que vivenciam de que é o fim do mundo.

No campo clínico, essa postura fatalista pode ser um desafio para o par Analista-Analisando. O analista deve estar atento ao que o analisando diz, porque ele ao narrar suas expectativas sombrias, revela, de fato, suas feridas mais profundas. O trabalho analítico, então, consiste em desmantelar essa visão rígida e determinista, permitindo que o paciente possa ver, se dar conta e experimentar a multiplicidade de possibilidades que a vida oferece. É uma tarefa de desconstrução e reconstrução, onde se busca abrir espaço para o novo, para o inesperado que não necessariamente conduzirá à tão temida ruína.

Assim, ao acolher o indivíduo que vê a vida através de uma visão fatalista, o analista deve oferecer um espaço de escuta onde a angústia possa ser simbolizada e onde o medo do futuro possa ser transformado. Este processo exige paciência e sensibilidade, pois implica em confrontar a resistência do paciente em abandonar suas certezas apocalípticas e aceitar que não sabe como vai ser o futuro. No entanto, ao possibilitar essa transformação, abre-se a porta para uma existência mais plena e integrada, onde o futuro deixa de ser uma fonte de terror e passa a ser uma tela repleta de possibilidades.

Quem não se lembra de vários casos mundo afora que decretaram o fim do mundo várias vezes? Que esse ou aquele sinal era o prenúncio do apocalipse que iria acabar com todos e com o mundo. O mais triste é que muitos desses grupos, tão certos da vinda do apocalipse, convidavam seus membros a se matarem conjuntamente como uma tentativa de se anteciparem ao fim do mundo e não serem ceifados de maneira desprevenida. Enfim, vimos muitas tragédias assim.

Se o indivíduo consegue ressignificar suas ansiedades e medos, transcendendo o fatalismo que antes o aprisionava, haverá menos chances de cair nesses enganos. Este é o verdadeiro objetivo da psicanálise: proporcionar ao indivíduo a liberdade de viver, em toda a sua complexidade e incerteza, sem estar refém dos fantasmas do passado ou das catástrofes imaginadas do futuro.

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