O uso compulsivo de drogas é um problema sério que afeta muita gente, não só quem usa, mas também suas famílias e toda a sociedade. É um dos maiores problemas de saúde pública hoje em dia. Como psicanalistas, como podemos ajudar a pensar essa questão? Por que as drogas são tão atraentes e perigosas?

Quando nos deparamos com pessoas usando drogas compulsivamente, ficamos assustados e tendemos a adotar uma postura dura, como se fôssemos policiais ou donos da moral, e ignoramos arrogantemente o problema, achando que não nos afeta, a menos que atinja nossas famílias.

Vejamos o crack, que é considerado uma droga muito perigosa. Sempre o vemos como algo que acontece nas áreas miseráveis e afastadas, até que os viciados em crack aparecem em nossas ruas, vivendo nos viadutos das cidades e mostrando sua triste realidade. Isso nos faz refletir sobre como podemos ajudar através de ações sociais. Será que o problema está na droga ou na situação de abandono em que essas pessoas vivem?

As drogas oferecem uma forma de escapar das nossas dores emocionais, especialmente aquelas que não conseguimos expressar e ressignificar em momentos difíceis da vida, nos oferencendo uma sensação de prazer que parece vir de dentro de nós, sem precisar dos outros, e alimentando um sentimento de poder, mesmo quando estejamos incapazes de desejar, sonhar ou planejar nossa vida.

Além disso, as drogas nos dão uma identidade falsa, uma sensação de pertencimento a algo: "Sou viciado"… "Sou dependente"… Dizemos isso como uma justificativa e explicação para a situação em que nos encontramos. Como psicanalistas, não devemos reprimir moralmente o uso indevido de drogas, mas reconhecer a sua presença em nossos consultórios e nossa responsabilidade em relação a esse problema.

A psicanálise não tem a intenção de ditar regras para prevenir o uso de drogas, mas mostrar que, para entender e lidar com o problema, precisamos entender a pessoa que usa ou abusa das drogas. Essas pessoas merecem respeito por sua dor e devem ser elas mesmas a traçar seu próprio caminho, e não serem levadas para o que, socialmente, se deseja para elas. O foco deve se debruçar sobre a pessoa que sofre e não em tentar, de alguma maneira, “consertar” o problema.

Precisamos urgentemente compreender que "prevenção" das drogas não significa ter um plano pronto que só funciona se as pessoas simplesmente pararem de usar as drogas. Essas pessoas que sofrem por causa das drogas sofrem antes vulnerabilidades em si mesmas, que ficam encobertas e desconhecidas. As drogas, em si, não são o problema a ser unicamente visto, mas uma consequência de algo que está nas dores emocionais e na forma que uma pessoa interpreta e pensa a própria vida. Um possível caminho para expandir mais a prevenção é identificar vulnerabilidades em crianças, jovens ou em certos grupos sociais, como famílias.

Precisamos encarar nossos preconceitos e entender que a verdadeira prevenção não é para salvar as pessoas desse inferno que são as drogas e que as levam a se tornarem viciadas. As drogas não têm o poder de nos transformar no que não somos. Elas nos levam por caminhos estranhos, muitas vezes porque já estamos em um estado estranho. Muitas vezes o inferno está dentro de nós mesmos e é ele que devemos ousar olhar e cuidar.

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A opinião do colunista não é, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina