Minha primeira tela foi do Cine Ouro Verde, tão menininho que só lembro da cena final do filme Quo Vadis, quando rebrota o cajado fincado por São Pedro. O cinema era pertinho de casa mas sua tela era do mundo (ou do mundo norte-americano, como eram quase todos os filmes. Ou, conforme Plínio Marcos, a gente conhecia mais do farwest do que da nossa vizinhança).

Não cheguei a ver o cinema a céu aberto, filmes projetados em parede caiada, todo mundo em pé ou em cadeira trazida de casa. Mas o cinema não é o ancestral da telinha que hoje levamos nas mãos. Esta é de outra família tecnológica, a da televisão, que não projeta imagens numa tela como o cinema; a televisão capta imagens e sons, converte em sinais eletrônicos, que envia para longe, onde o televisor os reconverte em imagens e sons. E, como a tevê fica em nossa casa, podemos aumentar ou baixar o som!

O som era alto nos cinemas da infância, a meninada falando, gritando, aplaudindo e batendo os pés nos seriados. Hoje, com celular e fones de ouvido, podemos ouvir música alto sem incomodar ninguém. Mais que a transformação da tela, hoje sensível ao toque, a evolução multimídia evidencia como vivemos as duas eras tecnológicas mais rápidas da História. Do machado de pedra ao de metal, centenas de milhares de anos. Da eletricidade à eletrônica, poucas décadas com tantas mudanças em nossas vidas.

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. | Foto: Reprodução

Lembro de nossa primeira tevê, em 1964, rapazola fascinado por aquela tela mas também leitor apaixonado, então via Bonanza (foto) com livro no colo para ler nos intervalos. Os comerciais eram ao vivo, feitos no estúdio da Televisão Coroados, ou eram eslaides com letreiros. Nos comerciais da cerveja Londrina Chop, Dinho Gordo consumia uma garrafona num minuto. Começava falando já com copo cheio, que bebia e depois falava mais enquanto enchia novamente o copo que voltava a beber, um prodígio de sincronia!

No Telenotícias Transparaná, o apresentador Antonio Belinati comentava as notícias com olhares e sorrisos irônicos, iniciando assim carreira política como tantos outros da telinha. Se o cinema não nos legou políticos, a televisão foi e continua sendo uma usina disso, já porque muita gente gosta de votar em quem acha que conhece... É tal a influência da tevê nas nossas informações e eleições, incluindo as redes sociais que são suas netas, que vivemos numa telecracia.

Cheguei a ver televizinho, aquele que ainda não tinha tevê e ia espiar na casa de quem tinha. Havia televizinho de sofá e de janela. E na tela tinha Bonanza, o mesmo oeste norte-americano do cinema... Já hoje a tela de casa ou a telinha da mão acessam filmes e tudo mais do mundo todo, além dessa maravilha que é o zap. Inclusão é condão da telecracia.

Mas mesmo a tela mais avançada é retangular como as mais antigas pinturas, e entretanto a Terra é redonda como nossa cabeça. Então zapeio e googleio, evitando me enquadrar numa só fonte de informações, crendo que na telecracia o preço da liberdade de pensamento é a vigilância e a individualidade só se acha na procura.